. O que é a amizade depois ...
. Da epifania televisiva de...
. Hoje constatei que é dia ...
. Discurso directo I e II (...
. Os dias em que todos nós ...
. outros lugares
. grilinha
. leelala
. oh joy
. the busy woman and the stripy cat
. Blogs de outras mães (e pais)
. mãe 360
. caco mãe
Titiri, tiriri, tiriri (com entoação do sound trek do "Phyco")...
Não estivesse eu tão assoberbada de trabalho e seria mais assídua a postar aqui no blog.
Não estivesse eu tão consumida de energia e estaria com mais paciência para uma reunião de tão grande magnitude psicológica.
Não estivesse o meu par com compromissos académicos inadiáveis e tinha ele rumado, escada abaixo, ao encontro dessa pequena multidão tresloucada a que, e à falta de outra designação, nos habituámos a chamar de "vizinhos".
Ora uma reunião de condóminos na sua essência até podia ser uma coisa agradável. A gente levava uns bolinhos, umas cadeirinhas, sentava-se, comia, fumava um cigarrito e ia discutindo as questões prementes que se colocam a um prédio que, de novo, só mesmo a conduta de água do ano passado.
Mas não. É velho o prédio e são velhos e rabugentos os donos. Isto é como tudo na vida: a acção gera reacção e no meu prédio é só gerar acção para ver quem é mais mauzinho e tem a pior reacção para depois se agir novamente e, como no ditado, "com ferro queimas" e com outra coisa pior levas (que agora não se me está a vir à memória o resto ), as reuniões do meu prédio servem de terapia de grupo para duas coisas: fazer as pazes de anteriores discussões vicinais e, ao mesmo tempo, firmar novas discussões, fazendo rodar a quem se deixa de falar este ano.
Isto é uma coisa anual (aaallleluuuuiia) mas que deixa marcas para o ano inteiro e se vai arrastando, transformada em histórias míticas do prédio" ad eternum.
Estava eu a ver se não adormecia no sofá, à espera das 19h, para descer até ao hall quando abro os olhos e vejo que já passavam 10 minutos! Nem foi preciso espreitar, já se ouviam os gritos do sr. O., intercalados com a afónica voz da vizinha E. Lá vou eu, sem me pentear nem nada, em direcção à peixeirada (para o que uma pessoa está guardada!- como diz a minha avó a propósito de qualquer situação chata ou inesperada).
No átrio do prédio estavam o já citado sr. O., pessoa "muito calma" (cit.) mas que, por qualquer motivo inexplicável, fala a gritar fazendo uso e abuso do seu vozeirão de homem grande e boçal. Tem uns laivos de falsa modéstia que apimenta com os seus dotes escondidos de engenharia (estruturas e betão explicam todo o mal do prédio, da rua e da freguesia) e faz brio em usar palavras "caras" a meio das frases mais básicas e, sem querer, altera-lhes completamente o sentido, o que faz com que a característica que se lhe destaca é o facto de ninguém o entender bem e de cada vez que fala ou há alguém que pergunta "desculpe, não percebi" ou então ficamos calados com medo da interminável explicação, desconexa, mais uma vez.
Lado a lado, a dupla E., reformada e cusca de profissão actual e sua inseparável vizinha maravilha, a dona C., proprietária de um cabelo super oleoso que se resolvia facilmente com um tratamento dermatológico (digo eu, mas não sei), adepta do Benfica e da selecção nacional (em dia de jogo é vê-la à janela a discutir futebolada com a amiga cusca e vestida de vermelho, barrete e cachecol, mais os dois filhos menores a gritar "vamos ganhar, vamos ganhar" no hall comum). Fazem lembrar aqueles fadistas das desgarradas pois terminam as ideias e as frases de cada uma.
Estava também, hoje um pouco amorfo e cabisbaixo (a mulher não é vista há algum tempo...) a pessoa mais paciente do mundo (e o meu vizinho menos antipático), o administrador cinquentão do ano transacto. Pessoa pacata e afável que fala quando é mesmo necessário, não quer saber de histórias, nem da vida alheia e tem um sentido de humor muito próprio, embora numa reunião de condomínio ninguém o consiga apreciar devidamente ou perceber completamente.
Falta mencionar o sessentão sr. H. (se o zezecamarinha tivesse um irmão mais velho, seria ele) homem casado com uma esposa que só é vista a estender roupa e, de resto, vive enclausurada no lar. O H. tem uma história de vida muitooo misteriosa (dizem as más línguas que já cantou em casinos, já foi comerciante em "África" e é "pessoa de muitas posses"). Ora posses o H. pode ter, mas tento na língua, não tem. Para além de uma evidente tendência machista muito vincada e que a mim me causa hiper irritação (do género de me chamar "menina", mas ao meu par vai de "senhor", só para exemplificar) é um homofóbico de primeira água e um racista insuportável. Para ele todos os males do prédio se devem (não à engenharia e ao betão) mas aos dois homens "de leste" ("deléste" qualquer dia já é nacionalidade, pelo menos no meu prédio) e a um brasileiro que andaram há um ano (há um ano, senhores!!!) a mudar a conduta de água!
E estava eu. Rapariga ensonada e cansada, mas desempoeirada que ainda tentei entalar o pseudo engenheiro O. com umas perguntas técnicas mais complicadas e fi-lo gaguejar (yaaa!!!) e ainda dei um ar da minha graça a tentar acalmar o sr. H, dizendo "tenha calma que já não tem idade para se enervar assim" com ar de sonsinha só mesmo para chatear (penso que consegui pois fulminou-me com um olhar machãozão, mas que só na mulher dele deve surtir efeito... gargalhei interiormente, devo confessar).
Discutia-se a requalificação do prédio e outros assuntos banais, mas que têm toda a razão de ser nalguma dimensão deste universo ou de outro paralelo: quem se esquece mais vezes de fechar a porta do prédio; a barata avistada há umas semanas nas escadas; quem atira espinhas para a varanda do 1º andar (urgh que nojo! Eu não sou!) e la crème de la crème: um saco que apareceu misteriosamente no átrio e que lá ficou quase um mês e a E. mais a C. até pensaram tomar a iniciativa de chamar aquela "polícia dos terroristas", mas depois procuraram nas páginas amarelas e não vinha o nº (onde?- pensava eu- na letra "p" de "polícia de terroristas"?!) e só finalmente quando a E. "apanhou" o carteiro é que lhe pediu para abrir o saco e contou a história e "até o senhor ficou com medo" e não o quis abrir e aconselhou a chamar a polícia!!! Isto é normal?! O saco lá ficou e foi o administrador quem o foi abrir. Aí a C. e a E. não o largaram para ver o que tinha dentro (e eu pensava "e então se a pseudo bomba rebentasse?") e vai-se a ver tinha papel de jornal e outros papéis, tudo amachucado. Este episódio deu para uma hora de converseta e discussão, pois o H. gritava que era alguém do prédio a gozar com ele (porquê ele? aquilo estava no r/c, pensava eu...) e que se descobrisse, "a coisa fia mais fino" (espectáculo, tanto cliché provoca-me ondas de irritação) e o "outro que não pagou 2 meses" e ninguém o adverte e a administração que não faz nada, nem muda lâmpadas...
Um filme! Isto foi uma curta metragem com duração de filme porque só jantei duas horas depois, não aprendi nada e estou aqui, desde então, a fazer contas para ver se consigo mudar-me nos próximos anos para um prédio com vizinhos normais!