Em relação à pobre criatura humana que, por ter apenas 13 anos, se viu envolvida numa bronca todo o tamanho mercê das inovadoras concepções relativas à infância e a um excesso de zelo jurisprudente actualmente omnipresente em cada esfera doméstica do mundo ocidental, só tenho a dizer que a pobre tem toda a minha solidariedade na provação pela qual está a passar que eu leio assim: os Estados ocidentais primeiro mundistas (para além de servirem para roubar dinheiro alheio e aplicá-lo mal) mostram, mais uma vez , que são bons, mas mesmo bons, é a cortar raízes ao pensamento.
A pessoa de 13 anos queria fazer a volta ao mundo num veleiro (ou coisa que o valha), os pais não viram mal, deram conhecimento institucional aos oráculos estatais competentes: a criança ficaria 2 anos sem frequentar o ensino obrigatório. A seguir retiram a criança aos pais. Depois acusam-nos de negligência. E ainda por cima a criança é entregue a outrem e não vai a lado nenhum.
Andei a ler os comentários tão politicamente correctos de leitores virtuais, fervorosos defensores dos interesses e dos direitos da Criança (os primeiros a fazer ouvidos moucos e olhos vesgos a negligências e abusos vários que por vezes decorrem por debaixo dos seus narizes) e acho espantoso a forma como as ideias e as mentalidades em torno de um conceito tão falacioso e tão novinho como a infância sejam desculpa (esfarrapada) para soterrar a liberdade individual das pessoas. Mesmo das pequenas.
Só para contrariar: uma pessoa de 13 anos não deixa de ser uma pessoa, apesar de nesta história tão parva ser o interlocutor ausente. A motivação de se fazer uma viagem à volta do mundo tem um significado aos 13 que deixa de ter aos 19, muda aos 25 e aos 30 já não é de todo a mesma. Eu não sei, porque nunca fiz, mas a experiência deve ser transformadora, tão ou mais enriquecedora do que dois anos de educação formal; a criança não ia ser criada por lobos, nem sujeita a negligências bárbaras ou abusos de qualquer espécie. Dantes aos 13, a criança estava casada (e em muito país deste mundo está); dantes aos 13, a criança já trabalhava (e em muito país deste mundo antes); dantes, aos 13 nunca tinha ido à escola (e continuam a não ir) e por aí fora.
O curioso está em que são aqueles que aplaudem a celeridade e prontidão do Estado no acto de cercear a liberdade individual que lêem (ou nunca leram) os livros de aventuras do Rudyard Kipling, do Jack London, do Stevenson ou do Herman Melville e dissertam sobre a excessiva falta de autonomia da juventude hoje e, nos livros acham essas vivências fantásticas, exóticas até, mas sem sentido fora da esfera da fantasia porque, no fundo, são uns hipócritas sem ambição que esperam que os filhos lhes sigam as pisadas, acabem a universidade para ficar desempregados e nada mais lhes reste porque no meio de tanta protecção parental confundida com excelência de educação, esqueceram-se de lhes arranjar um lugar, nessa vida toda tão clean e pré-definida, para o sonho, para a criatividade, para a sua liberdade individual e lhes mataram o seu sentido de identidade própria durante a infância, tão protegida, tão organizada, tão chata. São esses leitores que se pudessem linchavam os pais da pessoa de 13 anos. E porquê? Porque valorizaram uma fantasia adolescente e lhe permitiram concretizá-la. E o contrário era o quê? Os nossos leitores comentadores, donos da razão: aos filhos deles resta-lhes mesmo arranjar um emprego após a universidade, caso contrário, não sabem o que fazer para além de recorrer ao fundo de desemprego, tomar prozac e culpar os outros da sua má sorte.
De facto a Holanda é conhecida por ser um país que cultiva a tolerância, por isso, esta notícia não me espanta nada.
1. Na maioria das vezes acho os comentários dos leitores da imprensa online bastante descabidos. É tipicamente tuga servir-se do anonimato para descarregar todo o fel acumulado no dia-adia.
2. Quanto ao caso concreto, creio que deve prevalecer o bom senso: afinal de contas é uma menor adolescente.
Pessoalmente acho que os pais deveriam-na autorizar a concretizar o seu sonho quando atingisse a maioridade.
3. Porém, acho que a Justiça foi demasiado radical, pois deveria ter encontrado outra solução que não a de retirar a tutela aos pais.
4. Tanto quanto sei, no norte da Europa cultiva-se muito a autonomia pessoal, tanto que muitos jovens aspiram a ser independentes muito cedo.
Cá é precisamente o que dizes nos últimos parágrafos.
De
Mspirit a 28 de Agosto de 2009 às 18:23
O problema aqui é que a vontade dessa viagem prematura é apenas o querer bater um record. Querer dar uma volta ao mundo é um sonho, querer entrar no record guiness é patetico.
Por outro lado existem meninas que com essa idade apenas queriam poder frequentar a escola...
Ora, minha querida, tiro-te o chapéu.
Ponto de vista muito bem definido, estruturado, e quase, quase que concordo contigo... o quase deve-se ao facto de não ter tido tempo para pensar no assunto (só li sobre o assunto aqui, as férias toldam-nos o raciocínio, o tempo dispersa-nos - e se não veio na Sábado, única revista de notícias com direito a acompanhar as férias daqui da menina, não sei mesmo nada sobre o assunto...)
Mas deixa-me que te diga que me assusta imenso a hipótese de a pequena apanhar uma BIG tempestade em alto mar... é que para essas, nem com uma valente tripulação... olha, não sei, não sei mesmo... mas acho que os pais devem saber, não? Eu tenho um pilinhas com 13 anos, e deus e livre, o rapaz lá era capaz? A menina em questão, pelos vistos, era!
De qualquer maneira, parabéns pelo post... se chegar a alguma conclusão, digo :o)
B'jinhos e bfs,
Fátima
Não vos parece que um adolescente necessita de estar inserido numa sociedade para formar o ser caracter?
Não creio que o isolamento de 2 anos seja algo saudável para alguém, muito menos para uma criança de 13 anos. Quando o objectivo é tão ridículo como entrar no guiness!
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