
Tenho uma costela voyeurista, apanágio de todos nós, mesmo daqueles que contra-argumentam. O paradigma da tvi, salva da bruma de más audiências após recurso à aquisição do formato big-brotheriano, serve de fundamento. Nem vale a pena dissertar sobre a efemeridade da ribalta e a relação psico-sócio-virtual estabelecida em tubo de ensaio entre os enjaulados e os voyeuristas que reformularam o conceito de directo televisivo e acenderam debates éticos. Hoje, restabelecida a ordem universal do espaço-tempo pela normalização da coisa, a distância permite fazer evoluir a discussão a outro nível. Para o comum dos mortais, contudo, prevaleceu uma ideia (peregrina, diga-se) associada ao mediatismo, rapidez e eficácia da facilidade de transformação de um qualquer anónimo em “figura pública” enquanto o diabo esfrega um olho, centralizando o mundo e a verdade do mesmo, temporariamente, nesse universo difuso.
Noutra dimensão paralela, que é aquela em que me lêem, abundam blogs concentrados neste princípio da velocidade mediática. À ideia dos 15 minutos de fama televisiva (que, diga-se, hoje em dia já foi experimentado por 75% dos habitantes do país) e aos democráticos you tube e face books sobrepõe-se uma nova profissão de sonho: ser conhecida/o (já não por 15 minutos, mas “para sempre”). Sem ser necessário curriculum, arte, engenho ou outra especialidade académica parece ser o futuro de sonho de muito adolescente neste mundo e no real. Visivelmente, por entre posts e posts, a aspiração vai sendo alimentada através de “figuras públicas” com uma notória projecção adolescente em seu torno.
Isto é fascinante porque nos diz bastante sobre as várias dinâmicas pós modernas em que mergulhámos democraticamente ao mesmo tempo que o resto do mundo ocidental e tecnológico e que vão contribuindo para uma construção da identidade deslocalizada de proximidade ou afectos para a idealização massiva de referentes globais.
Faz confusão a muitos a reformulação de valores intrinsecamente ligados a um princípio muito nobre, mas hoje em dia pouco eficaz, que primava pela ideia de que o sucesso advinha do esforço intelectual e braçal (esta uma linha de força de blogs de pessoas mais velhas do que eu).
Ao ler alguns posts de blogs de pessoas mais novas é evidente o descrédito dado ao futuro baseado em vários anos de estudo; constata-se que, muitos, experienciam de perto situações de precaridade laboral dos pais; para outros, a ordem natural do mundo é terminar o secundário e depois ver em que dá; nota-se também a ausência de perspectivação sobre futuros laborais positivos. Esta última é muito normal e também se passou comigo: aos 16 anos é um pouco ridículo escolher áreas estudo quando o futuro é um mundo de possibilidades e uma coisa que há-de chegar um dia, sabe-se lá quando.
Para desconstruir a ideia (que deve ser tão centenária como o castelo de são Jorge) de que “a juventude está perdida”, algo que acontece de 25 em 25 anos, ou seja, cada geração superior esmaga com este dogma derrotista a que lhe antecede, apetece-me referir a constatação de que há blogs muito interessantes alimentados por pessoas pequeninas. E vejam lá que até pensam (!) e racionalizam coisas e avançam explicações e sustentam-nas. Alguns escrevem mesmo muito bem (para pessoa pequena com vocabulário de quem já leu algumas coisas) e deviam ser lidos por pais, pois fornecem mais material para compreensão do estado adolescente do que muito calhamaço secante, com a vantagem de serem grátis.
Nesse universo de blogs adolescentes constatei uma evidência (para além de que o mundo não estará perdido): observações sobre o mundo em geral muito interessantes, umas mais poéticas, outras mais intimistas, outras em tom de ensaio, outras telegráficas, análises e evidências quotidianas pertinentes e que a maioria dos blogs das pessoas adultas parece bloquear por excesso de auto-centração. Isso é uma coisa que nos primeiros dá equilíbrio ao quotidiano que os alimenta e afasta-os da mediocridade.
Isto vai imediatamente no seguimento de outra constatação pós viagem, pequena, na blogosfera: convenhamos, há por aí blogs básicos muito presunçosos que facilmente patenteiam características ruinosas a outros, avançando juízos de valor sobre as pseudo-pretensões dos autores com base num critério próprio que, se faz sentido no seu blog, nada tem a ver com o de outros (outras pessoas, diferentes de si) e que, no fim, acaba por ser uma arremetida mesquinha, subjectiva e sem sentido e que tem notoriamente associada a infantil premissa de “o meu blog é melhor do que o teu!”. O que isto tem de ridículo é ser gerador dos mais variados feed backs, ser alimentado por um grupo de “guardiões” blogueiros que tomam as dores dos atingidos e serem visionados por centenas de almas que não se pronunciam, outras que se pronunciam, mas com erros ortográficos, outros que se pronunciam e são apelidados de cobardes porque não colocam nome (?!) numa espécie de bola de neve, fugaz.
Na natureza destas relações estão subjacentes características e problemas (alguns até acho que mentais) pessoais e intransmissíveis. Seria possível, num qualquer tipo de estudo de caso, limitar um universo de blogs e as suas redes e tentar classificar tipologias de pessoas. Não sei se foi por ter visto “A Onda” há pouco tempo, mas estariam nesse grupo blogueiro decerto que um tímido, um invejoso, um ou dois com a auto-estima em baixo, outros tantos com ela demasiado em cima, um bonzinho, a ninfomaníaca, três ou quatro apaziguadores, dois ou três líderes, um rezingão, uns quantos avarentos, outros tantos chatos, um paternal, outra maternal, a má, o psicótico, a religiosa e por aí adiante.
Tudo isto para dizer que percebi que quem perde tempo a escrever e a nutrir uma coisa deste tipo até pode ter aspirações comerciais (aparentemente a discussão actual versa sobre a edição em livro de um blog conhecido- e eu com isso?!), partidárias, religiosas, sociais ou outras, essa não é de todo a motivação principal e, apesar dela não estar lá escrita, eu induzi que deve ter a ver com a liberdade de dizer o que se pretende sem o esforço de fazê-lo na primeira pessoa (porque aqui somos sempre a nossa segunda pessoa, aquela que ninguém e toda a gente conhece) porque há coisas que não são para explicar e são simplesmente para serem ditas e porque, ao fazê-lo, ficamos muito mais leves e ninguém nos vem pedir explicações e nem o que dissemos contribui para alterar a imagem que os outros têm da nossa 1ª pessoa. A linha ténue que leva ao conflito blogosferiano tem a ver com a sobreposição dessa 2ª pessoa à 1ª, tenho quase a certeza, mas ainda vou perguntar a uma amiga psicológa. Se eu e muita gente não temos paciência para a discussão sobre o vazio (excepto alguns temas subjectivamente considerados “interessantes”) como é que conflitos centrados em pretensões e motivações alheias, de pessoas que verdadeiramente não conhecemos, movem dias e dias de discussões, acusações, insultos e outras barbaridades?
A minha viagem prospectiva na blogosfera acaba aqui e fico-me pelos links descritos ao lado e outros poucos que costumo visitar. É que, decididamente, não tenho tempo nem paciência para afastar o muito trigo que é preciso para se chegar a um blog que se diga “sim, senhor”, mas quem tiver paciência, persistam, eles existem com certeza porque este 2º mundo, à semelhança do 1º, também é muitoooo grande.
*Também nunca percebi aquelas pessoas que chegam ao blog alheio e desatam a injuriar o dono; isso e aqueles que nunca comentaram, mas que que por um distúrbio psicológico qualquer desatam a escrever posts, insultando um qualquer blog movidos apenas por um ódio de estimação inexplicável...
Gostei muito da tua acutilante análise e subscrevo-a.
De facto a blogo é um Admirável Mundo Novo, onde podemos encontrar todo o tipo de blogs, nomeadamente os que referiste. Há espaço para todos. É uma sociedade virtual pluralista e democrática.
Porém, nunca consegui compreender a popularidade de certos blogs metabolicamente reduzidos, cuja frivolidade é de fugir a sete pés, e que passado algum tempo são editados em livro. São sobretudo os chamados blogs de gaja (não confundir com os blogs escritos por mulheres, os quais têm nível). Mas cada um sabe de si...
Este post, dum blog que aprecio bastante devido ao sentido de humor do seu autor, é o que melhor resume o que sinto em relação ao fenómeno da blogo:
http://obomsacana.blogspot.com/2009/06/e-o-que-e-que-blogosfera-representa.html
Há coisas fantásticas, não há? ;)
PS: O meu blog não é melhor nem pior que os outros, é apenas diferente. Por isso, estou-me a borrifar para a popularidade, daí detestar reacções destas:
"O que isto tem de ridículo é ser gerador dos mais variados feed backs, ser alimentado por um grupo de “guardiões” blogueiros que tomam as dores dos atingidos e serem visionados por centenas de almas que não se pronunciam, outras que se pronunciam, mas com erros ortográficos, outros que se pronunciam e são apelidados de cobardes porque não colocam nome (?!) numa espécie de bola de neve, fugaz."
Gostei da abordagem do bom sacana, gostei:) E essa posição que tomas é precisamente a minha (há pessoas que usam isto como uma forma de dependência como se o que realmente interessa no mundo não se passasse "lá fora"... bj
De
sonjita a 28 de Junho de 2009 às 15:22
Fiquei contente quando aqui cheguei e vi um refresh na imagem e novos posts, mas fiquei triste ao ver que é a despedida.... é mesmo?
BJK GRD
Não é nada! Despedida, despedida, despeço-me para a semana e é só durante os largos dias das minhas almejadas férias:) até logo
De
sonjita a 7 de Julho de 2009 às 17:10
Ahhhhhhhhhhhhhhhhhh.... que susto [:S]
Boas férias
De
alx a 18 de Julho de 2009 às 01:13
bem visto
Comentário recepcionado:)
Olá! Vai parecer-te estranho eu entrar-te por aqui a dentro e vir-te falar de algo que nada tem a ver com o que aqui postas. tentei procurar um mail , por me parecer mais razoável, mas como não o encontrei, optei por fazê-lo mesmo aqui. Encontrei-te através de uma pesquisa google , onde fui parar a um post que "dedicas", no dia 18 de Janeiro do ano passado. Gostaria de saber no que deu isso. porque não consigo saber muita coisa e pode ser que alguém saiba... Porque existem coisas mesmo estranhas, se me entendes!
Desculpa a intromissão, mas quando a curiosidade aperta, socorremo-nos de todos os meios que podemos dispôr ! Não sei se isto tem publicação automática ou não. Mas... espero que me ajudes na minha questão.Gostei de cá vir ter, tenho pena é que tenham sido por motivos "esquisitos".
E já agora gostei
Olá pepita, lamento, mas não percebi bem qual era a tua questão. Esse post partiu de um mail que recebi que comentava um post anterior deste blog. Fiquei um bocado desconcertada pelo facto do comentário dessa pessoa anónima não ter sido feito aqui e sim para o meu mail pessoal (que na altura eu havia colocado no meu perfil). O conteúdo do mail era um bocado surrealista, mas inofensivo; daí ter postado nesse dia como resposta ao referido mail. No fim não deu em nada, tal como a maioria das coisas que se passam neste "não lugar". Ajudei? :)
sim, ajudaste... a pelo menos saber que não deu em nada!
Por estes lados, isso aconteceu, com a mesma pessoa, há pouco tempo.
Boas férias!
Sempre que venho aqui, surpreendo-me com os seus textos. Depois de ler os comentários, entendi o que a motivou a escrever este aqui. Faz pouco tempo que eu mantenho meu próprio blog, de cunho bem pessoal... Apesar de ter estudado anos à fio, só agora estou me encontrando na minha própria escrita. Gosto muito dos seus textos e posso imaginar o que você foi obrigada a ler em sua caixa de e-mail. Sinto muito...
Este mundo paralelo é bem esquisito mesmo... nunca se sabe quem está do outro lado. Mas você é de verdade! Até vi seus pés com unhas vermelhíssimas!
Bom, outro dia eu passo por aqui de novo para ver o que você anda aprontando.
Até!
Volta sempre Maíra (e obrigado pelos excelsos elogios) que eu também passarei no teu!
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