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Ó sensação de dia vazio de sentido! Encalhado entre um Dia Internacional Dos Monumentos (há 2 dias) e um Dia Mundial Da Voz (só na próxima 4ª) vivemos dias em verdadeiro limbo de efemérides. A meu ver ou seriam todos os dias, dias de alguma coisa, ou então não vale a pena calendarizar dias aleatórios.
Olhando para a minha completa agenda pessoal (a que somente se pode apontar a ausência dos dias atribuídos aos santos) não posso deixar de constatar que a comemoração dos dias é proporcional ao ritmo produtivo do país. A ver, Julho e Agosto são meses de completa penúria em termos de actividade comemorativa. Daí surgir o dia dos avós a meio de Julho. Portanto, a sily season também se reflecte no nosso calendário de dias-a-lembrar-sabe-se-lá-porquê.
Tenho um carinho especial pelo Dia do Relógio de Sol (marcador do dia do solstício de verão). É bonito, pronto. Dá um cheirinho a ócio e a coisa pagã ao mesmo tempo. É infantil, mas não infantilóide. Faz-nos recuar à origem das coisas.
Por outro lado, tenho um reparo a fazer ao Dia Escolar Da Não Violência e Da Paz (ali para o 30 de Janeiro) e que creio marca o dia em que, há duas décadas atrás, na minha escola preparatória, o meu colega de turma atirou a bola de andebol à cara do professor de educação física a meio da aula depois de advertido para parar de puxar as calças de ginástica das colegas para baixo (!), fracturando-lhe o nariz e, mesmo a espirrar sangue, qual elm street, ainda conseguiu, o pobre prof, ripostar, aplicando um senhor estaladão ao aluno prevaricador. Isto só para lembrar que a autoridade e o respeito entre duas forças que não deveriam ser iguais já há muito que anda pelas ruas da amargura e com o assentimento silencioso de vários governos desde o cavaquista, inclusive. Mas voltando ao Dia Escolar Da Não Violência E Da Paz considero que, não sendo, internacional deveria ser movido para o dia em que a, hoje famosa youtubiana, discípula desabrida foi possuída pelo espírito da regressão cognitiva até àquela fase ontogenética em que não se distingue o outro e só nos vemos a nós próprios, vulgo temos a mania que o mundo gira à nossa volta porque na nossa cabeça os outros existem para nos dar prazer. Isto é queridinho e fofinho aos dois anos de idade e é coisa para um tareão com uma vara de marmelo aos quinze. Os pais também marchavam e, segundo o meu avó, que é reaccionário, mas é engraçado (porque tal como os bebés, aos 85 anos, ser reaccionário é fofinho) fazia-lhes o mesmo que aos incendiários das florestas e que nem vou mencionar aqui do que se trata porque faria o meu avô parecer um sádico de primeira, coisa que no fundo não é, tem apenas um sentido de justiça muito próprio e perto da mãe-natureza.
Outro dia sem sentido, pelo menos para nós, portugueses, é o Dia Internacional Da Língua Materna. É sempre bom haver um dia que nos reafirme que temos uma; ainda para mais no dia 21 que é aquele dia em que quase toda a gente deve achar que não tem nada porque está-se a meio do mês e, não havendo dinheiro, uma pessoa sente-se logo melhor e mais protegida porque tem uma língua materna. Na escolha do dia para este dia reside um resquício do Salazar que temos dentro de nós (tipo, minha mãe é pobrezinha/ não tem nada para me dar/ dá-me beijos/coitadinha/ e depois põe-se a chorar).
Ainda há aqueles dias que guerreiam pelo protagonismo, pois, vá-se lá perceber, foram acumulados num apertado “dois em um”. É o caso do Dia Mundial Da Comunicação Social, ex aequo com o Dia Mundial Para O Desenvolvimento Cultural; ambos a 21 de Maio. Porquê? Uma coisa tem a ver com a outra? Como? Senhores do calendário, expliquem-me lá… Epá e já agora, o que é isso de desenvolvimento cultural? Apeteceu-lhes foi? Desenvolver uma cultura nova? Tentar mexer num sistema cultural já existente? Desenvolvimento Cultural como se se tratasse de fundo cultural que é pobre e vamos tornar mais culto e profundo…? O que é isso?
O Dia Dos Bombeiros vem junto com o da Energia… É piada de mau gosto, não? Bombeiros associados a Energia cheira-me a coisas com perigo de explosão lá escrito; a desastres e catástrofes provocadas por coisas tóxicas e inflamáveis. É de mau gosto juntarem, para memoração colectiva, duas realidades tão antagónicas, já para não falar que é confuso.
Agora o que me faz mesmo espécie (como sinónimo de estranheza) é instituírem o Dia Mundial Do Canhoto e deixarem de fora os destros. Só por si, esse esquecimento já é uma forma de discriminação pelos primeiros. Eu revoltar-me-ia, se fosse canhota. Até porque, como muitos sabem pela experiência, há por aí muito falso destro, portador de memórias recalcadas que recuam algures à infância e às atrocidades educativas “especiais” de que foi vítima na tentativa de erradicar esse comportamento desviante que era escrever com a esquerda. Esses, são essas vítimas que deveriam ter o seu dia, essas e mais nenhumas- o Dia dos Falsos Destros como memória futura para que nunca mais se cometam atrocidades do tipo de amarrar a mãozinha esquerda às crianças. Isto até me faz lembrar um episódio da Dharma & Greg quando ele constata com o pai as agruras de uma vida a usar a esquerda e o pai lhe responde que não, que foi preciso muito treino e que até foi muito complicado ele deixar de escrever com a direita, justificando essa atitude educativa paterna pelo exotismo de se ser canhoto e as vantagens que aparentemente isso tem para o protagonismo de alguém que jogue basebol…
Agora a efeméride que me deixa mesmo esperançada; aquela que, para mim, tem muito valor; aquela que dava direito a um repenicado beijinho meu na bochecha de quem dela se lembrou é o Dia Mundial Dos Direitos Do Consumidor!!! Ah! Isto sim! Nesse dia posso imprimir todos os e.mails já enviados, reenviados e re-reenviados para o call-center dessa lástima de empresa que é a tv cabo; cortá-los aos bocadinhos e lança-los em confettis da minha janela em forma de comemoração! É que é um dia mesmo útil: pode servir como introdução para uma carta de reclamação; é um argumento poderoso numa daquelas discussões presenciais ou telefónicas quase kafkianas com os serviços dos quais dependemos (pelo menos se não vivem numa comunidade isolada ali para a serra da Louça), só não faz bem à saúde. Até é verdade que atribuir um dia aos consumidores revela pelo menos o reconhecimento de uma evidência pós-moderna sobre o facto de que não existe quase ninguém, hoje em dia, que não o seja, mas isso torna também a coisa redundante; por outro lado, lançar assim um dia para o ar não dá razão nenhuma aos consumidores, só enfatiza a sua condição; depois, nem sequer nesse dia, os “serviços” dão uma borlazinha, o que o torna inútil e, mais, nem sequer nesse dia estaremos imunes à publicidade da Deco/Protest em que nos bombardeiam com um telefone, agenda electrónica, o-raio-que-os-parta de oferta se nos tornarmos assinantes da revista. Por isso e como estamos a caminhar para o consumismo irracional de consumirmos tudo o que há para consumir com o dinheiro que temos e com aquele que os bancos nos fazem pensar que temos, mas no fundo não temos, mas usámos porque o banco nos deu… devíamos era ter um dia internacional ou nacional, tanto faz, do “consumidor em recuperação” ou da doença consumista. Seria muito mais útil e dava também melhores reportagens nos telejornais. Há coisa que suba mais as audiências do que entrevistar alguém em recuperação, de alguma coisa, cuja dependência lhe estragou a vida?
Ah, boa ideia, não?