Quinta-feira, 25 de Junho de 2009
Tenho uma costela voyeurista, apanágio de todos nós, mesmo daqueles que contra-argumentam. O paradigma da tvi, salva da bruma de más audiências após recurso à aquisição do formato big-brotheriano, serve de fundamento. Nem vale a pena dissertar sobre a efemeridade da ribalta e a relação psico-sócio-virtual estabelecida em tubo de ensaio entre os enjaulados e os voyeuristas que reformularam o conceito de directo televisivo e acenderam debates éticos. Hoje, restabelecida a ordem universal do espaço-tempo pela normalização da coisa, a distância permite fazer evoluir a discussão a outro nível. Para o comum dos mortais, contudo, prevaleceu uma ideia (peregrina, diga-se) associada ao mediatismo, rapidez e eficácia da facilidade de transformação de um qualquer anónimo em “figura pública” enquanto o diabo esfrega um olho, centralizando o mundo e a verdade do mesmo, temporariamente, nesse universo difuso.
Noutra dimensão paralela, que é aquela em que me lêem, abundam blogs concentrados neste princípio da velocidade mediática. À ideia dos 15 minutos de fama televisiva (que, diga-se, hoje em dia já foi experimentado por 75% dos habitantes do país) e aos democráticos you tube e face books sobrepõe-se uma nova profissão de sonho: ser conhecida/o (já não por 15 minutos, mas “para sempre”). Sem ser necessário curriculum, arte, engenho ou outra especialidade académica parece ser o futuro de sonho de muito adolescente neste mundo e no real. Visivelmente, por entre posts e posts, a aspiração vai sendo alimentada através de “figuras públicas” com uma notória projecção adolescente em seu torno.
Isto é fascinante porque nos diz bastante sobre as várias dinâmicas pós modernas em que mergulhámos democraticamente ao mesmo tempo que o resto do mundo ocidental e tecnológico e que vão contribuindo para uma construção da identidade deslocalizada de proximidade ou afectos para a idealização massiva de referentes globais.
Faz confusão a muitos a reformulação de valores intrinsecamente ligados a um princípio muito nobre, mas hoje em dia pouco eficaz, que primava pela ideia de que o sucesso advinha do esforço intelectual e braçal (esta uma linha de força de blogs de pessoas mais velhas do que eu).
Ao ler alguns posts de blogs de pessoas mais novas é evidente o descrédito dado ao futuro baseado em vários anos de estudo; constata-se que, muitos, experienciam de perto situações de precaridade laboral dos pais; para outros, a ordem natural do mundo é terminar o secundário e depois ver em que dá; nota-se também a ausência de perspectivação sobre futuros laborais positivos. Esta última é muito normal e também se passou comigo: aos 16 anos é um pouco ridículo escolher áreas estudo quando o futuro é um mundo de possibilidades e uma coisa que há-de chegar um dia, sabe-se lá quando.
Para desconstruir a ideia (que deve ser tão centenária como o castelo de são Jorge) de que “a juventude está perdida”, algo que acontece de 25 em 25 anos, ou seja, cada geração superior esmaga com este dogma derrotista a que lhe antecede, apetece-me referir a constatação de que há blogs muito interessantes alimentados por pessoas pequeninas. E vejam lá que até pensam (!) e racionalizam coisas e avançam explicações e sustentam-nas. Alguns escrevem mesmo muito bem (para pessoa pequena com vocabulário de quem já leu algumas coisas) e deviam ser lidos por pais, pois fornecem mais material para compreensão do estado adolescente do que muito calhamaço secante, com a vantagem de serem grátis.
Nesse universo de blogs adolescentes constatei uma evidência (para além de que o mundo não estará perdido): observações sobre o mundo em geral muito interessantes, umas mais poéticas, outras mais intimistas, outras em tom de ensaio, outras telegráficas, análises e evidências quotidianas pertinentes e que a maioria dos blogs das pessoas adultas parece bloquear por excesso de auto-centração. Isso é uma coisa que nos primeiros dá equilíbrio ao quotidiano que os alimenta e afasta-os da mediocridade.
Isto vai imediatamente no seguimento de outra constatação pós viagem, pequena, na blogosfera: convenhamos, há por aí blogs básicos muito presunçosos que facilmente patenteiam características ruinosas a outros, avançando juízos de valor sobre as pseudo-pretensões dos autores com base num critério próprio que, se faz sentido no seu blog, nada tem a ver com o de outros (outras pessoas, diferentes de si) e que, no fim, acaba por ser uma arremetida mesquinha, subjectiva e sem sentido e que tem notoriamente associada a infantil premissa de “o meu blog é melhor do que o teu!”. O que isto tem de ridículo é ser gerador dos mais variados feed backs, ser alimentado por um grupo de “guardiões” blogueiros que tomam as dores dos atingidos e serem visionados por centenas de almas que não se pronunciam, outras que se pronunciam, mas com erros ortográficos, outros que se pronunciam e são apelidados de cobardes porque não colocam nome (?!) numa espécie de bola de neve, fugaz.
Na natureza destas relações estão subjacentes características e problemas (alguns até acho que mentais) pessoais e intransmissíveis. Seria possível, num qualquer tipo de estudo de caso, limitar um universo de blogs e as suas redes e tentar classificar tipologias de pessoas. Não sei se foi por ter visto “A Onda” há pouco tempo, mas estariam nesse grupo blogueiro decerto que um tímido, um invejoso, um ou dois com a auto-estima em baixo, outros tantos com ela demasiado em cima, um bonzinho, a ninfomaníaca, três ou quatro apaziguadores, dois ou três líderes, um rezingão, uns quantos avarentos, outros tantos chatos, um paternal, outra maternal, a má, o psicótico, a religiosa e por aí adiante.
Tudo isto para dizer que percebi que quem perde tempo a escrever e a nutrir uma coisa deste tipo até pode ter aspirações comerciais (aparentemente a discussão actual versa sobre a edição em livro de um blog conhecido- e eu com isso?!), partidárias, religiosas, sociais ou outras, essa não é de todo a motivação principal e, apesar dela não estar lá escrita, eu induzi que deve ter a ver com a liberdade de dizer o que se pretende sem o esforço de fazê-lo na primeira pessoa (porque aqui somos sempre a nossa segunda pessoa, aquela que ninguém e toda a gente conhece) porque há coisas que não são para explicar e são simplesmente para serem ditas e porque, ao fazê-lo, ficamos muito mais leves e ninguém nos vem pedir explicações e nem o que dissemos contribui para alterar a imagem que os outros têm da nossa 1ª pessoa. A linha ténue que leva ao conflito blogosferiano tem a ver com a sobreposição dessa 2ª pessoa à 1ª, tenho quase a certeza, mas ainda vou perguntar a uma amiga psicológa. Se eu e muita gente não temos paciência para a discussão sobre o vazio (excepto alguns temas subjectivamente considerados “interessantes”) como é que conflitos centrados em pretensões e motivações alheias, de pessoas que verdadeiramente não conhecemos, movem dias e dias de discussões, acusações, insultos e outras barbaridades?
A minha viagem prospectiva na blogosfera acaba aqui e fico-me pelos links descritos ao lado e outros poucos que costumo visitar. É que, decididamente, não tenho tempo nem paciência para afastar o muito trigo que é preciso para se chegar a um blog que se diga “sim, senhor”, mas quem tiver paciência, persistam, eles existem com certeza porque este 2º mundo, à semelhança do 1º, também é muitoooo grande.
*Também nunca percebi aquelas pessoas que chegam ao blog alheio e desatam a injuriar o dono; isso e aqueles que nunca comentaram, mas que que por um distúrbio psicológico qualquer desatam a escrever posts, insultando um qualquer blog movidos apenas por um ódio de estimação inexplicável...
Segunda-feira, 22 de Junho de 2009
vivermos connosco próprios o dia todo. Temos de nos aturar, encetar diálogos contraditórios, falar sozinho, irritarmo-nos, chamarmo-nos de parvos, pensar e repensar ao milésimo de segundo a reacção, pentearmo-nos,... quanto mais antecipar reacções alheias?!
Agora junta-se a isto viver com outra pessoa.
De outro género.
Que também fala sozinha consigo, atura-se a ela própria, dialoga em surdina, percebe ao contrário ou demora a perceber, faz que não percebe porque primeiro se percebe a ela.
Depois ainda juntam-se a duas, num fim-de-semana. Em dois dias de calor. Calor que provoca irritação. Irritação que nada mais é do que simples irritação.
Depois imbirra-se durante um sábado.
Faz bem. Equivale a um desgaste de 20 quilómetros para uma e a um conjunto de 50 flexões para outra.
Depois porque se imbirrou esqueceram-se pormenores muito importantes:
o chapéu de sol para a praia;
a garrafa de água;
a carteira.
E o que existe de bom em conhecermos o grau de imbirração e a diléctica da mesma é que ela pára lá no sítio onde o poder se esconde e se negoceia.
E hoje não ganhou ninguém: eu besuntei as costas vermelhas dele com o meu melhor hidratante e ele pagou o jantar.
E partilhámos bolinhos de côcô enquanto fazíamos o roteiro para as férias.
Terça-feira, 16 de Junho de 2009
Coitadinhos de nós que acordamos para ir trabalhar depois de tantooos dias libertários.
Pessoalmente foi custoso ontem. Uma pessoa passa uns dias a passear, a tomar banhos de mar e de sol, a ler livros calmamente, com o telemóvel desligado ou a receber apenas chamadas daquelas mesmo boas, das que nos convidam para ir beber caipirinhas e comer caracóis e ir beber cafés e ir à praia e depois vem a segunda feira e abruptamente entra-se na espiral da maluqueira laboral, assim… de repente… logo de manhã… sem prelúdio, sem nada…
Ora eu sou uma rapariga muito positiva, mas tenho dias. Constatei desde logo que me falta precisamente um mês para abalar daqui para outro sítio. Por pouco tempo é certo, mas agora isso também não interessa. Fiquei melhor. Muito melhor.
A seguir começou a trovejar.
E depois começou a chover. E eu sem carro que decidi exercitar-me e fui a pé.
Às vezes é difícil manter o optimismo.
Antes de sair estive a ouvir um colega a dissertar sobre os mitos urbanos que grassam sobre este tempo. Para quem vai a pé para casa não é coisa boa de fazer. Constatámos que ao tempo de trovoada estão associadas histórias desgraçadas, impossíveis de comprovar factualmente. Cada uma quase dava um fado.
- num dia de trovoada como o de hoje um senhor passeava, não se sabe onde, nem quando, nem porquê, na praia. Tinha um molho de chaves no bolso, também não se sabe se era porteiro ou outra coisa qualquer. De repente um trovão, dois trovões e o terceiro atingiu o pobre homem que morreu de modo fulminante;
- num dia de trovoada como o de hoje uma rapariga nova fazia jogging na praia. Tinha uma pulseira metálica. Lá veio o trovão. Morreu. A praia estava com muita gente e foi logo ela, proprietária de uma bracelete, a desgraçada a quem o raio tinha de atingir. Pode ter sido há muitos anos ou o ano passado, não há possibilidade de datar ou contextualizar melhor a história, ela circula por aí.
E depois lá fui eu para casa, a pé, a olhar de viés para o céu e para as minhas sandálias que têm uma pequena fivela metálica, mais as minhas pulseiras de latão e o meu fiel anel de prata, com as chaves dentro da mala, mas com muito medo de perecer e tornar-me também eu numa história esquisita… num dia de trovoada como o de hoje uma rapariga nova, muito gira e trabalhadora, tinha acabado de sair do trabalho. Ia a pé para se exercitar. Podia ter ido de carro, mas precisamente nesse dia tinha escolhido ir a pé. Tinha duas pulseiras metálicas fininhas, uma cinzenta e outra lilás; mas foi o anel de prata, muito grande, quem a atraiçoou. Lá veio novamente o trovão e...
Bem, quando cheguei a casa foi um alívio. Conversa mais parva de se ter no final de um dia assim…
Hoje a conversa mudou: a senhora da limpeza augurou catástrofes mercê da conjunção calor exótico- céu nublado.
Como se vê, o optimismo português anda pelas ruas da amargura...
Domingo, 14 de Junho de 2009
Quem se interessa pela arte de fazer cidade (ou a arte gentil de unir espaços como o arquitecto Pancho Guedes define o seu ramo) ou simplesmente pela arte de imaginar outros mundos sugiro uma visita à exaustiva exposição Vitruvius Mozambicanus (no Museu Berardo no CCB).
Trata-se de uma viagem pelas correntes formais da arquitectura contemporânea (das influências de Gaudi às de Loyd Wright) e acima de tudo pela construção de um estilo muito pessoal onde a arte tribal e os materiais da sua terra de eleição, Moçambique, estão permanentemente em relação com uma visão muito ocidental da arquitectura não só enquanto técnica, mas principalmente como modo de harmonizar e dar significado a espaços físicos e culturais, formas e conteúdos, usos funcionais e sentidos de consumo. Afastado das ideias corbusianas, este é um dos derradeiros arquitectos pós modernistas, mesmo antes do conceito ter sido atirado para o mainstream.
No percurso expositivo encontramos uma panóplia de vertentes interligadas que, no fundo, são reflexo da vivência e da evolução pessoal do senhor, do contacto com os seus pares, das suas viagens, dos seus afectos, do simbologismo dos locais por onde passou: desde projectos construídos a outros que não saíram do papel, em todos eles a legendagem é feita em discurso directo: é o arquitecto quem nos fala daquilo que vemos e vai contando as peripécias de cada peça, cada casa, cada cemitério, cada escola, cada prédio, cada rua, cada jardim,...
Para quem aprecia os sentidos humanos da arquitectura, a exposição de Pancho Guedes dá a conhecer (talvez até demasiado exaustivamente) aquilo que de mais fascinante eu encontro na arquitectura: a sobreposição da coerência da coisa feita e o reconhecimento da visão sociológica do mundo de quem projecta à megalomania da ideia artificial de criar o espaço que parece, cada vez mais, ganhar terreno.
Sábado, 6 de Junho de 2009
Se ofuscar digam qualquer coisinha.
Voltei do meu período de hibernação.
A minha hibernação é só cibernauta; para tudo o resto é muito laborosa.
Tenho estado muito ocupada a descansar quando não trabalho. E no convívio after hours. Foi da Primavera. Hoje como choveu...
Tenho andado também muito pensativa. Afinal as eleições ocupam-me muito tempo de meditação. Deve ser porque eu levo muito a sério o meu voto e demoro-me a pensar nisso. Assim, os tempos os tempos de antena têm ocupado muito do meu tempo. A seguir aos Contemporâneos é o meu programa televisivo de eleição: tem um candidato que fala como quem dança lambada, uma senhora que faz a campanha sozinha, uma série de alienados antagonistas da UE, outros que distribuem florinhas e são tão fervorosos adeptos das teorias do Proudhom que me fazem rir (com respeito democrático) e ainda disponibilizam, todos eles, périplos etnográficos pelo país pouco profundo deveras interessantes.
Também ganhei uma série de coisas à borla (?). Estranho, eu sei. Bastava-me pôr um pé na rua e caía-me em cima uma coisa gratuita. De modo que andei muito atarefada.
Como já estava a ficar farta de tanto vermelho mudei o template deste sítio e atirei para aqui a senhora com vestido verde da Lempicka. Não prima pela originalidade, mas como eu não sou apetrechada com dotes pictóricos...
Voltarei em breve. Agora vou descansar que isto de andar a tentar acertar com os itens todos da configuração cansa muito.