Os livros infantis estão, cada vez mais, no top das minhas coisas preferidas. Confirmam, os entendidos nestes assuntos, o facto de toda a gente possuir uma criança dentro de si (excepto as grávidas, que nessa ordem de ideias, carregam três ou mais). O meu ego infantil revela-se mais nesta apetência por leituras infantis. Pronto.
De vez em quando ofereço um a uma criança alheia, mas sou daquelas compradoras de livros infantis para consumo próprio.
Gosto de uma boa estória no papel mas, ainda mais, se acompanhada dumas ilustrações a condizer. Existem ilustrações fabulosas e outras de fugir. Com colagens, desenho, recortes e fotografias, tudo misturadinho; de um minimalismo irresistível, linhas, traços, formas desconstruídas, com perspectivas e sem perspectivas; com desenhos aguarelados impressionistas, as ilustrações que me deixam a imaginação à soltasão as minhas preferidas. Odeio aqueles desenhos, metidos à força no meio dos textos, previsíveis, monótonos e decalcados da história que não lhe acrescentam nada.
Entre o tempo em que eu era piriri até hoje, o mercado editorial infantil sofreu um boom enorme. Ou a culpa era dos meus pais (do resto da família e também dos pais dos meus amiguinhos) ou não havia mesmo muita opção de escolha: “fazes anos? Surprise! Toma lá a Anita está doente!”; “É Natal? Toma lá a Anita mamã! Ainda não tens esse, pois não?”; “Queres um livro? Escolhe lá um da Anita!”. Era tanta a fartura que a minha mãe, mulher pragmática, guardava os livros repetidos para, num acto pioneiro de reciclagem, os voltar a colocar na esfera da troca em aniversários vindouros de coleguinhas da filha. Resultado: mesmo assim e não tendo para troca, sou hoje uma orgulhosa proprietária de uma valente estante cheia de "Anitas" editadas entre 1979 e 84...
Cronologicamente ensaduichados entre a “Anita” e os livros “com mais letras que desenhos” estavam as bandas desenhadas do mainstream da época: o tio patinhas, a Mônica e o Bolinha, tudo em português de outro continente, o que, face a críticas sobre os perigos para a incorrecção linguística infanto-juvenil, tenho a testemunhar o contrário e a engrandecer essas edições pelo enriquecimento intercultural de gerações de criancinhas: uma pessoa aprendia sinónimos muito interessantes, tipo “ônibus” (em vez de autocarro), “caipira” (em vez de saloia), “casquinha” (em vez de gozar), “bala” (em vez de rebuçado); o que, neste ponto, questiona a criatividade de um anúncio televisivo de um treinador de futebol. Do Donald e do Mickey nunca gostei, o primeiro era parvo todos os dias e mais ingénuo que eu, na altura, o segundo era um convencido arrogante. E o Pateta fazia juz ao nome.
Depois e pela ordem natural das coisas, comecei a ler literatura mais densa (eh, eh,eh). Os livros da Condessa de Ségur e outros autores do século XIX, tipo, Frances Burnett e Francine Fontainet, numa colecção imensa de uma editora que eu penso que já não existe, a Editorial pública, em que alguns dos títulos faziam chorar as pedras da calçada!!! Eu bem lia aquilo e achava o contexto das histórias um bocado moralista demais. Aquela fixação na educação e na bondade também me faziam torcer o nariz desconfiada; ainda mais estranho era o facto de quase todos os personagens viveram em mansões e palácios ou então em casebres infectos e nenhum, nenhunzinho, viver num prédio! Mas quando somos pequeninos o conceito de tempo não tem lá muito sentido e eu ia feliz lendo aquelas histórias a achar que, em França, o número de órfãos e orfanatos era assustador e que ainda toda a gente vivia em palacetes no campo e não havia prédios. Contemporâneos desta colecção foram os livros da Alice Vieira, da Sophia de Melo Breyner e umas histórias do Connan Doyle sobre o Sherlock condensadas nuns livrinhos de capa rija. Os “cinco” vieram depois, mas a epopeia “Uma Aventura” não me convenceu (depois de tanto século XIX, aquilo devia parecer-me actual demais).
Outros houveram, mas agora não me apetece estar a nomeá-los a todos...
Hoje uma pessoa vai à Fnac e fica boquiaberta com a quantidade e, no meio de tanta fartura, apaixono-me pelas ilustrações. Aqui há uns dias, depois de andar algum tempo a conter-me, lá comprei estes, portadores de ilustrações tão “quicas”, se bem que muito diferentes um do outro, e umas histórias muito bem contadas. Não são nenhuma novidade editorial poqrque já têm uns dois a quatro anos. Eu não resisti:
Neste não resisti ao rato e aos desenhos e aos pormenores das ilustrações no cabeçalho das histórias, muito barrocas e arte nova. A autora é uma americana que se farta de ganhar prémios e já tem outros livros traduzidos para português (As aventuras de Winnie Dixie é dela, mas não tenho a certeza se o título é este).

"A Lenda de Despereaux", Kate DiCamillo. Edições Gailivro.
E este, para quem gosta de BD e já conhece o Neil Gaiman e o Dave Mckean, a história é do primeiro, pois claro, e as ilustrações (espectaculares), do segundo. As crianças devem ficar fascinadas porque é uma aventura muito provável na imaginação de uma criança e, para os pais, é sempre muito pedagógico para ver o que vos acontece se caem na rotina de não terem tempo para as vossas crianças!

"O Dia em que Troquei o Meu Pai Por Dois Peixinhos Vermelhos" da Colecção Vitamina, da Devir
Já os li e recomendo!